Preso em 4 de agosto de 2010, o ex-goleiro do Flamengo Bruno Fernandes
de Souza, 32, foi condenado, no dia 8 de março de 2013, a passar 22 anos
e três meses na cadeia, por homicídio triplamente qualificado e
ocultação de cadáver contra a ex-amante, Eliza Samudio, entre outros
crimes. Graças a uma decisão liminar do ministro do STF (Supremo
Tribunal Federal) Marco Aurélio Mello, no entanto, ele deixou a prisão
na noite desta sexta-feira (24). A
linha do tempo do processo até agora foi determinante para que Mello
concedesse o habeas corpus --o que ocorreu na terça (21), mas só foi
divulgado e cumprido ontem. Recorrendo ao STF da decisão de 2013, do
Tribunal de Justiça de Minas Gerais, a defesa de Bruno alegou "excesso
de prazo da constrição cautelar, uma vez transcorridos mais de três anos
desde o julgamento, sem análise da apelação". Tratava-se, argumentaram
os advogados, de antecipação de pena.
Mello, conhecido por seu
perfil "garantista", ou seja, apegado à garantia dos direitos sociais do
indivíduo, entendeu que os fundamentos da prisão preventiva decretada
pelo juízo do Tribunal do Júri da Comarca de Contagem (MG), de primeira
instância, não se sustentavam. O ministro aceitou a reclamação da defesa
de que, decorridos três anos desde que impetrou-se apelação no Tribunal
de Justiça de Minas, o recurso de Bruno ainda não tenha sido julgado.
"O garantista é aquele que preza pelo direito penal mínimo, mais pela
liberdade do que pela segurança. Em outras palavras, é aquele que aplica
a pena no mínimo que a lei permite", explica o professor de direito
penal da USP (Universidade de São Paulo), Victor Gabriel Rodriguez.
Magistrados "garantistas" costumam defender o direito à liberdade até que o réu tenha esgotado todas as instâncias de recurso.
No despacho que deu a liberdade a Bruno, Mello escreveu que o Juízo,
"ao negar o direito de recorrer em liberdade", considerou a gravidade
concreta da imputação. "Reiterados são os pronunciamentos do Supremo
sobre a impossibilidade de potencializar-se a infração versada no
processo. O clamor social surge como elemento neutro, insuficiente a
respaldar a preventiva", argumentou o magistrado, querendo dizer que a
opinião pública contrária ao goleiro não é suficiente para manter a
prisão.
Para Rodrigues, a decisão de Marco Aurélio reitera uma
jurisprudência que o próprio ministro ajudou a firmar no STF. "O Código
de Processo Penal fala na prisão preventiva apenas pela ordem pública.
Antigamente, o juiz justificava algumas decisões 'face ao clamor
popular', mas já há alguns anos o Supremo decidiu que só o clamor
popular não é o suficiente", afirma.
Em sua decisão, o ministro
do STF deixou clara a posição contrária ao caráter permanente da prisão
de Bruno. "A esta altura, sem culpa formada, o paciente está preso há 6
anos e 7 meses. Nada, absolutamente nada, justifica tal fato. A
complexidade do processo pode conduzir ao atraso na apreciação da
apelação, mas jamais à projeção, no tempo, de custódia que se tem com a
natureza de provisória."
No entendimento do professor da USP, é
mais "fácil" que o STF dê esse tipo de decisão porque, quando chega lá
na instância mais alta, a pessoa geralmente já está há anos na cadeia.
"Quando um tribunal de primeira instância aplica uma pena longa, é mais
difícil manter a pessoa livre esperando as decisões sobre os recursos,
até porque ela pode se preparar para fugir".
Outros elementos
que justificaram a liminar de Marco Aurélio foram o que a defesa do
ex-goleiro chamou de "condições pessoais favoráveis do paciente": ele
era réu primário, tinha bons antecedentes, residência fixa e ocupação
lícita.
"Colocou-se em segundo plano o fato de o paciente ser
primário e possuir bons antecedentes. Tem-se a insubsistência das
premissas lançadas", escreveu o ministro.
NOTA UOL.